Fugindo da incômoda pergunta: “Onde foi que eu errei?”

 
“Fiasco”: é a palavra que melhor define as manifestações pró-Lula na noite de quinta-feira. Quem decidiu encarar o frio e comparecer a esses atos, que ocorreram em diversas capitais, ou é fanático ou perdeu benefícios com a saída do PT do poder. Mas mesmo com a flagrante diminuição de influência, o ex-poderoso Partido dos Trabalhadores segue fugindo da incômoda pergunta: “Onde foi que eu errei?”

Em São Paulo, a presença foi abaixo da expectativa, e ocupou apenas um quarteirão da Av. Paulista. Em 15 de março, cinco quarteirões foram ocupados — compareceram cerca de 80 mil pessoas. Quanto mais o tempo passa, mais apoio o partido de Lula perde. Por óbvias razões: está claro para qualquer cidadão que pense um pouco que o PT foi o grande responsável pela terrível crise que assola o país.

Um senador esquerdista — que teve a coragem de votar a favor do impeachment e, por isso, foi atacado em Belo Horizonte —, foi o único antigo apoiador do PT que conseguiu fazer um diagnóstico, muito bom, por sinal, dos erros dos social-democratas. Trata-se do Senador Cristovam Buarque, que publicou o artigo “Onde erramos, partidos e políticos social-democratas”, no site Diário do Poder, do jornalista Cláudio Humberto.

Para o senador, que não fugiu da incômoda pergunta, a esquerda não acompanhou a mudança dos tempos, ficou presa ao passado e a lutas que nem sequer fazem sentido em pleno século XXI. Além disso, fez opção pelas corporações, seja de empresários, seja de trabalhadores (sindicatos). Os aclamados “programas sociais” não passaram de migalhas concedidas aos beneficiários, enquanto as rodadas de negócios geravam lucro de milhões, por meio de contratos com estatais e subvenções obtidas de bancos públicos.

No ocaso de sua história, Lula e o PT recebem apoio justamente das centrais sindicais. Já os empresários, que se beneficiaram muito mais dos governos petistas do que os pobres, não apoiam Lula; presos, precisam se defender, e não titubeiam em entregar tudo o que sabem e têm como provas.

Em seu discurso na Paulista para uma plateia composta por convertidos, Lula xingou o juiz Moro e acusou azelite de estar incomodada com o êxito dos mais pobres. Ahn? Que êxito? O do desemprego? Porque o coitado que comprou um carro para pagar em suaves 72 prestações não tem nem sequer emprego para garantir o bem. Está endividado. Trata-se, ademais, de um terrível erro de diagnóstico: qualquer cidadão de bem deseja o êxito e o bem-estar de seus compatriotas, especialmente dos mais pobres.

Como bem diagnosticou Cristovam, enquanto davam bolsas e cotas aos pobres e isenção fiscal aos empresários (ricos), os governos esquerdistas criaram consumidores, não cidadãos. Não há economia que resista a aumento de gastos com diminuição da receita. Para a esquerda retrógrada, a fórmula do pão e circo não só é válida, como suficiente. Mas o trabalhador atual está mais exigente, quer mais sustância, se cansou de mentiras.

Falando em mentiras, aliás, Cristovam Buarque reconhece essa faceta dos partidos de esquerda, quando afirma que “caímos em narrativas falsas e passamos a acreditar nas próprias mentiras”. O PT já está naquele ponto no qual “mente que nem sente”. O povo, no entanto, sentiu na carne o quanto as consequências da mentirada petista recaíram sobre ele, e não acredita mais no partido.

Prova disso foi o recado nas urnas em 2016, quando o PT foi o grande perdedor das eleições municipais. A julgar pelas pesquisas para 2018, Lula ainda está em vantagem, mas como eleger um criminoso, condenado pela Justiça por corrupção? Reformulando a pergunta: como eleger um candidato comprovadamente corrupto? Na base do “rouba, mas faz”?

Não, não acho que o povo brasileiro apostaria nisso.

Lula já perdeu o apoio das massas. Não fala mais para multidões, apenas prega para convertidos. O discurso petista tornou-se paupérrimo.

No entanto, enquanto Cristovam Buarque, num raríssimo momento de transparência política, autoanalisa sua atuação e ideologia produzindo um artigo de primeira grandeza, outro senador, Lindbergh Farias, segue com a ladainha de sempre, ao bradar na Paulista que “Sergio Moro é um fantoche da Rede Globo”.

Sei não. A se acreditar nos rumores, com a delação de Antonio Palocci ainda veremos quem é fantoche de quem. Diz-se por aí que o ex-ministro vai revelar a ligação entre o PT e a Rede Globo, o que explicaria o enorme esforço do grupo de comunicação em derrubar o presidente Michel Temer.

Bom fim de semana procês!

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Na próxima sexta, não haverá crônica. Estarei perdida em algum paraíso tropical, fugindo do inverno e da seca brasiliense. Em agosto estarei de volta. Até lá!

Foto Ricardo Matsukawa/ VEJA.com

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