Cadeia: dos peixinhos aos grandes tubarões

1-5reading1A cadeia da corrupção, no âmbito da Operação Lava-Jato, está se desenhando claramente. Por cadeia, refiro-me à sequência com que a investigação vai desvendando a safadeza, e não ao recinto em que os meliantes vão parar. Tomemos como exemplo, de maneira bem simplificada, a cadeia alimentar marinha, começando com os vertebrados, já que nesta história só existem predadores. Os produtores — a base da cadeia alimentar — somos nós.

Tudo começou com a captura dos peixes pequenos: um doleiro e diretorezinhos de estatal. Depois, vieram os peixes maiores, os predadores de porte médio, digamos assim: os empreiteiros e outros empresários. Esses peixes são vorazes, mas muito dependentes do apetite do topo da cadeia: comem o que sobra para eles do jantar dos grandes tubarões. E devem ter muito cuidado para não serem engolidos por eles.

Os predadores de maior porte estão começando a aparecer.  Antonio Palocci talvez seja bem representado por um tubarão mangona, de hábito noturno, aparentemente calmo e lento, tímido, mas bem agressivo. Nessa espécie, uma fêmea pode acasalar com vários machos ao mesmo tempo. Gostam de uma orgiazinha.

Essa semana, foi a vez de capturar um tubarão-cabeça-chata. Esse tem uma peculiaridade: é capaz de subir o rio Amazonas até Manaus e é o principal responsável por ataques a humanos em água doce. Assim como Eduardo Cunha, que foi capaz de subir na política até a Presidência da Câmara do Deputados. E, claro, ataca humanos nas doces águas dos templos de seitas de idoneidade duvidosa.

Há quem reclame que Cunha deveria ter sido preso no mesmo dia em que teve o mandato cassado. Ora, não é assim tão fácil capturar um peixão desses. A rede precisa ser reforçada, as provas devem ser praticamente irrefutáveis.

Predador de inúmeras artimanhas, o tubarão-cabeça-chata não deixou vestígios de seu jantar, tamanha a certeza de que seria capturado. Não ficou um centavo nas contas declaradas de Eduardo Cunha. Quer convencer que possui parco patrimônio, apesar de sua famosa empresa Jesus.com ser detentora de vários veículos de luxo, e de sua esposa, que parou de correr atrás de notícias para correr atrás de joias, bolsas e sapatos de grife — tudo devidamente ostentado em redes sociais. Agora, ela e sua família estampam as páginas policiais, ilustrando os crimes de colarinho branco e mãos sujas.

Estima-se que a fortuna de Cunha, obtida por meios mais ilícitos do que jamais conseguiríamos imaginar, seja 53 vezes maior do que o declarado. O bloqueio de seu patrimônio foi de modestos 220 milhões de reais. Nada no Brasil. Contudo, a Suíça está dando sua colaboração — de paraíso está passando a inferno fiscal. Se bem que ele usou e abusou de laranjas e de toda sorte de recebimentos de dinheiro não contabilizados. Até o casamento de sua filha, luxuosíssimo, foi pago com depósitos em espécie, não identificados.

Todos sabemos da caixinha de maldades que Cunha sempre tem à mão. É fato que Cunha mete medo em outros peixes e até em alguns tubarões de periculosidade maior. O governo Dilma acreditava que o impeachment aconteceu unicamente devido a essa caixinha, desprezando a enorme quantidade de votos dos deputados, que atenderam ao clamor de seus eleitores.

Resta, ainda, capturar os tubarões mais perigosos: o tubarão branco, o tubarão tigre, este típico de águas nordestinas, especialmente as pernambucanas. Para estes dois, é imprescindível reforço na rede e na gaiola, estudo cuidadoso da estratégia de captura, de forma a prender para valer esses predadores vorazes. Na cadeia.

Bom fim de semana procês.