Regada a tannat

DSC09920 (640x480)Escrevo esta crônica de Montevidéu, depois de algumas boas doses de vinho tannat, a variedade exclusivamente uruguaia que eu adoro. Estou aqui a trabalho, mas vamos combinar, é um ótimo jeito de sair da rotina, ainda mais quando se está trabalhando com uruguaios e… argentinos! Apesar de muitas coisas, está sendo um encontro muito amistoso com nuestros hermanos. E, claro, vou praticando o español!

Mas não quero falar de trabalho, nem de espanhol. Vou confessar-lhes que estava preocupadíssima com eventuais comentários engraçadinhos sobre o inolvidável 7 x 1, sabemos bem como são os argentinos. E minha preocupação baseava-se no fato de que sou esquentadinha, escorpiana do primeiro decanato, e não queria ser a responsável por um incidente diplomático, ainda mais por motivo futebolístico. Obviamente o assunto na mesa girou em torno de futebol, imaginem se não seria numa mesa da parrillada onde estavam dois argentinos, cinco uruguaios e só eu de brasileirinha.

O que freia minha escorpionice, felizmente, é minha mineirice: como quietinha e espero a hora certa de falar. Nesse meio tempo, soube de toda a trajetória de vida do Luis Suárez, aquele da mordida na Copa do Mundo. Falamos do trio MERCOSUL no Barcelona: Messi, Neymar e Suárez. E então me pediram para explicar as competições nacionais no Brasil, o que era o Brasileirão e a Copa do Brasil. Aí eu expliquei, e, claro, falei que o meu Cruzeiro querido, tão combatido jamais vencido, será campeão. E que o Botafogo cairá para a segundona — eles conhecem o Botafogo por causa do Loco Abreu, e morriam de rir toda vez que eu falava em segundona, até agora não entendi o motivo, já que me explicaram o significado do que é de segunda, igual ao português…

Quando chegamos no assunto Copa do Mundo — claro, deviam estar ávidos para falar sobre isso —, eu já tinha entornado umas três taças de tannat. E, preocupada com o eminente incidente diplomático, saí pela tangente, falei dos custos dos estádios e dos elefantes brancos herdados da FIFA. Ufa! Todo mundo quis falar sobre os estádios, ganhei tempo com isso! Depois, critiquei o Dunga e o Mano Menezes e acrescentei que nem ia comentar nada do Felipão, por razões óbvias. Falei que eu queria o San Paoli como técnico do Brasil (apesar de ser argentino, a verdade é que ele é ótimo).

Se a essa altura, eu já tinha mandado três taças de tannat, os argentinos seguramente já tinham bebido o dobro, ou quase. Talvez por isso tenham sido finíssimos comigo e o 7 x 1 não foi lembrado. Pelo menos na minha mesa.

Mudamos de assunto e me contaram que “Avenida Brasil” tinha sido um sucesso e que eles amavam o Leleco e o Adauto, que era deprimido por ter perdido um pênalti. Agora estavam todos vidrados numa novela brasileira chamada “Rastros de Mentiras”. “Que novela é essa?”, perguntei, não a conheço. Me contaram o enredo, e então descobri que esse é o nome de “Viver a vida” aqui pelos pampas. São apaixonados pelo Antônio Fagundes, que agora “está muy mayor” e perdeu aquele charme todo. E quando contei que o Ninho era interpretado pelo mesmo ator que fez o Adauto de “Avenida Brasil”, surpreendi a todos. Perguntaram que novela está passando no Brasil agora e respondi que era “Império”, mas como não acompanho e não podia dar detalhes, disse apenas que deveriam aguardar, porque seguramente teriam grandes emoções, já que o enredo envolve o tráfico de pedras preciosas.

Na minha quinta taça de tannat e décima dos argentinos, falamos de pescaria. Uma das uruguaias veio com aquelas histórias de pescador, e mostrou sua foto com um peixão pescado no rio Uruguay, do lado argentino. Depois dos celulares com câmera, as histórias de pescador nunca mais serão as mesmas… Exibi fotos de surubim e tucunaré, peixes de rio grandes e coloridos. Conversamos sobre piranhas também, e aí aproveitei para ensinar a eles o segundo significado de piranha aqui no Brasil. E eles riram bastante de novo.

Na trilha sonora, “O Rio de Janeiro continua lindo…”, com carne e vinho tannat. Combinava mais com caipirinha, mas no Uruguai, melhor não. E nada de 7 x 1 na mesa. Consegui sair ilesa do que poderia ser uma situação embaraçosa. Os argentinos, meus colegas de reunião, deram um show de cortesia e gentileza. Mesmo assim, prefiro os alfajores uruguaios. O fim de semana, já sabem, será de gordices.

E um bom fim de semana procês!