Que a ponte não caia

River_Wenning_under_Hornby_Bridge_-_geograph.org.uk_-_640197As eleições terminaram, e para quase metade daqueles que optaram por fazer uma escolha entre os dois candidatos à presidência de Pindorama, o saldo não foi positivo. Se olharmos ao nosso redor, parece que todos saímos perdendo alguma coisa. Não me refiro ao governo que continua, mas àquilo que os ânimos provocaram, especialmente nas redes sociais.

Tentei não me manifestar muito publicamente. Postagem em rede social só fiz uma, e tive uma resposta tão agressiva de um amigo, que tomei uma decisão um pouco incisiva. Engana-se quem pensa que desfiz a amizade. Jamais permitiria que um tema como eleição definisse quem pode ou não ser meu amigo. Há questões muito mais importantes que regem uma amizade, a meu ver.

Mas a agressividade me incomodou, e então percebi que esse amigo não era o único. Resolvi, além de apagar o comentário, claro, deixar de segui-lo e impedir que minhas postagens fossem vistas por ele e por outros com comportamento semelhante. Com isso, não me chateei, não discuti com ninguém, não criei inimizade e, principalmente, não me incomodei com as barbaridades que porventura tais pessoas possam ter escrito. Não perdi amizades, mas perdi parte da confiança e da liberdade de me expressar com algumas pessoas. E isso me entristece.

Senti certa cobrança para que entrasse em campanha. Na verdade, faço o tipo mais discreto, não é do meu feitio congregar multidões. Não sei se meus amigos entenderam isso: é questão de personalidade, mesmo. Conversei com bastante gente, mas não tentei convencer ninguém. Esse papel, a meu ver era dos candidatos, afinal, eles é que seriam os responsáveis pelo (futuro) governo. Eu já estava convencida de meu voto, e a maioria daqueles com quem conversei também.

Não me furtei à discussão saudável de ideias, mas tampouco mudei a foto de perfil, nem fiz zilhões de postagens falando bem ou mal de quem quer que fosse. Viajei para o exterior e retornei a tempo de votar. Portanto, estava ali no momento crucial, aquele que realmente importa, na solidão e no tilintar da urna.

Como não me envolvi como muitos gostariam, posso até ser acusada de omissão. Todos têm o direito de pensar o que quiserem, não me sinto omissa, mas me decepciona que alguém pense que eu deveria ter agido assim ou assado.

As urnas deram um recado muito claro, e a presidente reeleita, ao que parece, entendeu. Portanto, ainda tenho a utópica esperança de que melhore alguma coisa. E isso, para mim, não é motivo de luto, ao contrário. Apesar de algumas tentativas que possam parecer autoritárias, ainda não vi cenas parecidas com as veiculadas na TV recentemente sobre a situação na Venezuela, nem com as que nossa gente viveu nos anos 1960 e 70. Portanto, a óbvia conclusão é que ainda estamos numa democracia, e que se essa foi a vontade da maioria, bola pra frente, minha gente!

Temos todos os mecanismos democráticos para que nosso país funcione pelo povo e para o povo: uma constituição promulgada pós-ditadura, garantindo nossa liberdade há quase 30 anos; uma lei que beneficia a transparência e a publicidade de documentos públicos; independência dos poderes; um congresso nacional que, bem ou mal, é a garantia de que estamos representados por aqueles que nós mesmos elegemos para isso. Quebrar o Brasil é fácil, mas destruir nossa democracia não me parece algo trivial. A primeira tentativa, aliás, já foi devidamente execrada pelo nosso Parlamento nos primeiros dias pós-eleições.

É por isso que estou estarrecida, e foge à minha compreensão essas manifestações preconceituosas e as bandeiras de “luto” nas redes sociais em referência ao resultado das eleições. A luta, essa sim, sempre continua, de um jeito ou de outro. E não podemos nos dispersar, como dizia meu conterrâneo e ícone das Diretas Já, Tancredo Neves. Manifestações preconceituosas e bandeiras de luto nos dispersam. Temporariamente, espero. Ainda estamos no calor da discussão eleitoral e em quatro anos, muita água vai passar por debaixo da ponte.

Que a ponte não caia!

Um bom fim de semana procês!

  Publicado também aqui