Anedotas imperiais

Ler romances históricos é uma de minhas atividades preferidas.  Simplesmente “devoro” os livros, tão envolvida que fico. Com “1808 – 1834: As maluquices do Imperador”, de Paulo Setúbal, editado pela Geração Editorial, não foi diferente.

As_maluquices_do_ImperadorÉ bem verdade que Paulo Setúbal foi um dos maiores escritores de seu tempo, ao lado de Monteiro Lobato.  Ocupou a cadeira 31 da Academia Brasileira de Letras, entre 1935 e 1937, deixando uma obra não muito extensa, mas bastante expressiva. Tanto que recentemente seus romances históricos vêm sendo reeditados, como foi o caso de “As maluquices do Imperador”.

Nesta obra de narrativa envolvente, Paulo Setúbal conta praticamente anedotas da vida de D. Pedro I e seus casos amorosos antes, durante e depois do casamento com D. Leopoldina. As histórias foram contadas com um senso de humor elegantérrimo, que nos arranca algumas risadas durante a leitura.  O tórrido romance com a Marquesa de Santos mal foi lembrado neste livro, pois mereceu especial atenção do autor, que publicou “1813-1829: A Marquesa de Santos”, obra exclusiva sobre o tema.

Depois do casamento com D. Amélia, o livro adquire um tom mais histórico, culminando com a guerra contra seu irmão D. Miguel, a coroação de D. Maria da Glória como soberana de Portugal e sua morte aos 35 anos de idade. Ainda houve alguns trechos bem humorados, como aqueles relativos à busca de uma nobre noiva europeia para D. Pedro I pelo Marquês de Barbacena. Uma vergonha!

Temos ainda que salientar que ele não teve uma formação muito apropriada para um rei, pois saiu de sua pátria ainda criança, em circunstâncias nada honrosas, e acabou vivendo o resto da infância e a adolescência entre atrizes (que naquela época eram quase meretrizes) e frequentadores de botecos.  Nesses ambientes arranjava suas amantes e fazia firmes amizades, como por exemplo, o Chalaça – o tipo de gente pouco interessada na pátria (até porque ele era português), mas bastante interessada em obter títulos e condecorações. E este homem, que conheceu D. Pedro I em uma noitada num botequim, cantando lundus e tocando violão, chegou a ser Secretário do Gabinete Imperial e Comandante Imperial da Guarda de Honra! Paulo Setúbal afirma que o homem culminante do primeiro reinado foi o Chalaça. Simplesmente porque era amigo de D. Pedro I. Penso que para ter cargos no governo sempre foi desejável que se houvesse um mínimo de formação ou, naqueles tempos, alguma fidalguia… Nenhuma dessas opções se aplicava ao “ilustre” Chalaça.

Outra marcante característica de nosso primeiro imperador era o amor que nutria por seus filhos: todos eles, incluindo os ilegítimos filhos com a Marquesa de Santos e outras amantes.  Foi por amor à sua primogênita D. Maria da Glória, a rainha Maria II de Portugal, que D. Pedro I decidiu guerrear contra o usurpador do trono português, seu irmão D. Miguel. Curioso ainda é que Pedro I do Brasil ou Pedro IV de Portugal era um homem liberal, constitucionalista, com valores até democráticos, ao contrário de D. Miguel. Combater o absolutismo do irmão em Portugal o fez um dos maiores herois portugueses, merecidamente.

Esta obra deixa mais claro do que nunca que D. Pedro I era só coração. Ele até tinha alguns lampejos de razão, mas era seu coração que governava sua vida e foi com o coração que ele fez a independência do Brasil e guerreou em Portugal. Talvez por agir sempre tão emocionalmente, D. Pedro I tenha sido tão amado e tão odiado ao mesmo tempo, seja no Brasil, seja em Portugal.  Ainda assim, realizou grandes e decisivos feitos, deixando sua indelével marca nas histórias das duas nações.