Homem com H

 

Ainda estou extasiada com o Instagram, mas antes de ter conta nessa rede social, eu já seguia a Leda Nagle no Youtube. Para mim, é a jornalista que mais sabe entrevistar, muito mais do que a Marília Gabriela. Pois foi numa das entrevistas da Leda que me reconectei ao artista Ney Matogrosso. E posso dizer, com todas as letras, eis aí um homem com H, maiúsculo.

Ney, definitivamente, não é um artista fabricado. É completo: canta, dança, interpreta. Sua voz tem timbres que emocionam, seu corpo se expressa inteiro. No show, ele cuida de tudo: desde os figurinos até a iluminação de palco. O resultado é um conjunto harmonioso que une voz, cores, luzes, texturas, ritmos, expressão, movimento.

O artista tem opinião própria, independente. Está inserido no contexto do país e tem visão crítica da realidade, que pode ou não combinar com alguma corrente de pensamento. O fato é que Ney Matogrosso tem seu próprio posicionamento político, sem se importar em agradar ou desagradar. Pensa e reflete com profundidade e se expressa autenticamente.

Claro que o estou seguindo no Instagram — acho que essa rede social vai estar presente na maioria das minhas crônicas daqui por diante. E percebo que Ney não tem um staff que faz suas postagens ou que, eventualmente, responde a comentários. Parece que é ele mesmo quem posta o conteúdo, pelas fotos e pelas respostas.

Ney Matogrosso é um artista performático; seu Instagram é repleto de vídeos dos shows, adoro! Gosto demais de performances, desde que sejam originais e que transmitam beleza, afinal, arte é beleza, e beleza é, basicamente, harmonia. Ney Matogrosso é a síntese de tudo isso.

Não podemos dizer o mesmo de outro(a) artista performático(a). Refiro-me a Pabllo Vittar — ainda não consegui entender qual artigo usar na frente de seu nome, me desculpem.

Antes que comecem a grita me chamando de preconceituosa, quero dizer que adoro drag queens. Antigamente — não me lembro se era no Show de Calouros do Silvio Santos —, havia uma espécie de competição de performances de drag queens. Espetáculo! Obviamente, havia exageros, mas existia harmonia, ou seja, havia beleza. E beleza é arte.

Outra coisa que curtia antigamente eram aqueles desfiles de fantasias de carnaval em que o Clóvis Bornay era o rei absoluto. Quanta arte e quanta beleza naquilo, gente! Não vemos mais nada parecido por aí e, se tais desfiles ainda existem, a mídia não dá a menor bola.

Comparar Ney Matogrosso, ou as drag queens de concursos, ou Clóvis Bornay e outros carnavalescos com o(a) Pabllo Vittar chega a ser covardia. Contudo, tenho dificuldade de entender o sucesso estrondoso que está fazendo. Nas aulas de dança das academias só dá ele(a).

A voz não é nada bonita e tem uns timbres que, com um pouco de sensibilidade nos ouvidos, dá para perceber que o(a) cantor(a) não tem afinação. A sensualidade de Pabllo é vulgar, ao contrário da sensualidade de Ney Matogrosso, cheia de elegância e com ares de certa superioridade.

Pabllo, me parece, é um “artista” fabricado. Por quem? Pelas redes sociais e pela mídia. Há alguns dias, por exemplo, foi publicada uma story no Instagram do Estadão com uma performance surpresa de Pabllo no metrô de São Paulo, na estação Fradique Coutinho. A grande imprensa se rendendo ao bizarro. Penso que a notícia deveria ser dada, afinal, não é todo dia que ocorrem performances de artistas famosos no metrô paulistano, mas daí a divulgar vídeos é outra história.

Concordo com Ney Matogrosso quando diz que acredita e defende a liberdade de cada um ser o que é. Para Ney, essa diversidade de manifestações de gênero que vemos hoje nada mais é do que uma resposta à caretice da sociedade. Em outra entrevista, desta vez a Pedro Bial, Ney disse que é homem e que gosta de ser homem: é cisgênero, como dizem. Realmente, esse mundo está cada vez mais chato — é preciso chacoalhar.

E nada mais justo do que cada um ser o que bem entender, o que sentir, o que é. Contudo, o que vemos hoje em dia é uma imposição, praticamente uma doutrinação de que o gênero com que nascemos não nos define, e que as crianças podem escolher ser o que quiserem. Aqui, convém abrir um parêntese. Independentemente de qualquer “escolha”, uma coisa talvez nunca possa ser mudada: nossa espécie tem dois cromossomos sexuais, X e Y. Um par XX define o sexo feminino e um par XY define o sexo masculino. Assim, qualquer um vai viver e vai morrer carregando a genética que o acaso lhe concedeu.  Quando arqueólogos do futuro fizerem uma escavação e encontrarem os restos mortais da Rogéria, por exemplo, dirão apenas: foi um homem que viveu entre os séculos XX e XXI. Farão a datação do Carbono 14 para definir a época daquele esqueleto e o sequenciamento do DNA revelará que o par de cromossomos sexuais era XY. Fecho o parêntese.

Não critico Pabllo por ser o que é. Critico o incompreensível sucesso de algo que nem consigo classificar como arte. Não vejo harmonia entre voz, ritmo, expressão corporal, figurino, texturas etc. Enxergo apenas desordem e feiura, completados por um repertório horroroso. Socorro!

A única explicação é que vivemos numa sociedade que sente atração pelo bizarro, pelo feio. Parece que o povo está em transe, hipnotizado, sei lá. Cá pra nós, nosso mundo e principalmente a arte brasileira precisam de mais homens com H.

Bom fim de semana procês!

Quem quiser assistir à entrevista que Ney Matogrosso deu à Leda Nagle: https://youtu.be/cANRDfu8dC8

Foto: Divulgação